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sexta-feira, 24 de agosto de 2012

Janela do Tempo - O FURTO

  O FURTO  
             Educador Glauco César




Encontrava-me encostado preguiçosa e despreocupadamente naquela frondosa jaqueira, na medida em que observava, à minha frente, as folhas do jamelão balouçando de um lado para o outro, numa estranha coreografia, talvez, em agradecimento pela enxurrada que há pouco houvera acontecido.
Foi muito bonito, no momento que divide na metade o dia alumiado, às doze horas, em meio ao calor estonteante, ver o dia mudar de rumo e, com medo e desconfiança, perceber os ventos empurrarem as nuvens escuras, com ímpeto desgovernado, em direção ao sol, fazendo-o fugir do céu e, de repente, o dia escurecer.
O tufão impetuoso e contínuo, a chacoalhar as árvores de um lado para o outro, que procuravam agarrar-se desesperadamente ao solo, para não serem arrancadas violentamente de suas moradias, que é o chão!
As nuvens escuras sacudidas de uma extremidade a outra, feito um bobo pêndulo de relógio ao bel-prazer do vendaval.  Aquele vento muito forte e tempestuoso provocou uma luta descomunal a ponto de bradarem trovejadamente, retumbando num ribombeio ensurdecedor.
A luta foi tamanha que de repente, pudemos, com esses olhos que a terra haverá de comer, observar até mesmo as armas utilizadas naquela luta desumana e desigual.
Eram lanças refulgentes, que eram jogadas com o intuito de rasgar o bucho do céu. Esses relâmpagos com suas descargas de eletricidade atmosférica abriram as comportas do espaço limitado pelo horizonte, fazendo chover copiosamente sobre a terra.
A água que caía, fazia subir aquele cheiro gostoso de terra, que só sentimos quando chove.
Naquele instante precipitava sobre mim, uma tristeza e uma saudade incontida, não sei lá de que!
Isto é comum em dias de chuva! Então, escavaco minha mente procurando lembrar-me do ilembrável!
  Como minha recordação continuava confusa, com o esfregão da mente, jogo para fora o apontamento da lembrança sem vestígio algum, pois, nada foi retido nas idéias adquiridas anteriormente...
Ah! Sim, lembro-me perfeitamente do acontecimento inusitado ocorrido com mamãe, ontem depois do almoço.
Isto só poderia ter acontecido com ela mesma! Seria impossível acontecer com outra pessoa. Eu aposto!?...
Veja só quem vem chegando, com seu jeito maroto e brejeiro. Como sempre despreocupado, mas boa praça.
Quando o vejo, começo a rir, só de imaginar a gargalhada que Salta Caminho dará, ao tomar conhecimento da última novidade, acontecida com Dona Encrenca, que é como papai comumente se refere à minha mãe!
Salta Caminho chega logo comentando que, por causa da chuva repentina, ele foi obrigado a almoçar na casa da madrinha, Dona Benta, esposa de Seu Dilermando, que tem uma dúzia mais quatro, de filhos.
Dezesseis filhos! São muitas bocas para dar de comer, sem contar que de vez em quando, Salta Caminho que é seu afilhado, sem prévio aviso, obriga Dona Benta acrescentar água no feijão, pois, termina comendo por lá.
Foi exatamente o que aconteceu hoje.
-       Eu posso contar o que aconteceu? Retruca Salta Caminho.
-       Pode! Desde que eu conte o ocorrido com mamãe, ontem quando ela veio do trabalho para almoçar. Falei de modo imperativo!
-       Pois é, (disse Salta Caminho), mamãe pediu que eu levasse para sua comadre Dona Benta um bolo de mandioca, o danado cheirava tanto que minha venta se ascendeu. Desde lá de casa até o rancho de madrinha, minha boca ficou cheia d’água, a ponto de me sufocar, quase provocando uma tragédia... Meu afogamento.
Quando lá cheguei, logo fui gritando: Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!...
Zeferino, o filho mais alvoroçado, então respondeu: - Para sempre seja louvado!
-       Entra menino de Deus, chegou na hora boa. Vamos matar quem está nos matando?
-       Quero não seu Dilermando, vim só trazer esse bolo, mamãe está me esperando.


Foi justo aí que o dia pretejou, e uma rajada forte de vento sibilante correu pela casa, e, sem ter nem pra que, começou a chover forte!
Assim, fui obrigado a ficar para o almoço. A comida já estava posta na mesa. Ou melhor, já estavam distribuídas nos dezoito pratos. Não havia sobrado nadica de nada nas panelas, tudo já estava equitativa e parcimoniosamente distribuído!
Madrinha, mais que ligeira, colocou na mesa outro prato e, imediatamente retirou um pouquinho de cada prato. Assim o milagre da multiplicação estava completado!
-       Olha, Salta Caminho, é pouco, mas é de coração e com muito amor. - Disse Dona Benta.
Ao que retruquei: Dá-me com pouco amor, mas com muita comida! Ora essa!...
Todos me olharam espantados. Então eu disse: É brincadeirinha! E sorrimos juntos.
- Imediatamente interrompi meu amiguinho passando a contar o que houvera acontecido dia anterior com minha mãe.
Como você sabe, mamãe e papai estão roçando a terra de Seu Quincas, que teve um mal súbito, um tal de passamento passageiro!
Por conta do tal treco, o pessoal planejou um mutirão, por isso mamãe vem pra casa antes de papai. Prepara o almoço e, geralmente volta para o mutirão antes de papai chegar.
Para não perder muito tempo, ela faz o percurso utilizando sempre da “sopa” que faz a linha para essas bandas.
Pois bem, ontem, quando mamãe chegou, preparou o almoço, quando a comida estava esquentando, ela aproveitou para tomar banho.
Almoçou apressadamente, como diz o pessoal daqui, ela rodeou a mesa e partiu!
Por estar na hora da lotação passar, ela foi até o ponto. O ônibus logo chegou, então quando mamãe foi passar na borboleta sentiu que um homem mal-encarado se aproximou e, de forma desajeitada bateu no seu braço.
Só então mamãe percebeu que não estava mais com o seu relógio de pulso. O danado do homem o roubara. - Que ladrão safado! - Retrucou consigo mesma.
Sem dizer nada, ela foi decidida a recuperar o roubo. Senta no assento ao lado do salafrário.
Trêmula, desajeitada, mas, decidida, abre uma sacola onde carregava alguns pertences de mulher, pega uma escova de pentear cabelo, encosta o cabo da escova, na barriga do homem mal encarado, aquele salafrário que momentos antes lhe roubara o relógio e, em tom decidido, com a sacola ainda aberta, diz ao meliante: - Ponha aqui, rapidamente o relógio!
- O homem ante a surpresa e assustado, tira o relógio de seu braço, sem dizer uma única palavra, e em face à pressão do objeto contundente, de forma ligeira e dissimulada coloca o relógio na sacola.
Mui rápida foi a reação de mamãe. Pede parada ao ônibus!
O motorista encosta o veículo. Chorando mamãe desce do coletivo e volta desconsolada para casa.
Ao chegar à nossa casa ela conta o ocorrido, para papai, que já havia chegado, pedindo dele as devidas providências.
Nesse instante surge, não mais que de repente, Célio Pneu, meu irmão menor, que saíra do banheiro gritando: - Mamãe!... Mamãe!... A Senhora deixou no banquinho do banheiro... O seu relógio!?...
- Entregando-a o cobiçado objeto!

2 comentários:

  1. Jerfferson Douglas, grande primo e amigo, te sou grato pelo compartilhamento

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  2. Oi, maninho César. Amo ler os seus contos. Você é genial! Parabéns!

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